Ok.
Nasces, e toda a gente te ama. Todos te querem conhecer. És literalmente a novidade do momento. No meio de tanta confusão, tu que ainda nem tens noção das coisas, borraste e eles mesmo assim fazem o maior festival. Começas a falar, caminhar, brincar... Enfim, cresces.
A cada nova fase da tua vida tens os teus pais como apoio. Eles que nunca te faltaram com nada e fazem os possíveis e impossíveis para que isso nunca aconteça.
Entras na escola, e nem guardas assim tantas memórias dessa altura. Eras muito novo para te lembrares. A fase seguinte é o drama dos TPC, esses que te atormentaram a vida. Fazes tudo facilmente, até que no nono ano aparecem os exames. A partir daí já começas a ter a mínima noção das escolhas que fazes para o teu futuro, ou devias. Supostamente contas com ajuda de uma psicóloga, que te irá indicar o curso mais certo para ti. A seguir entras no secundário, sentes-te o maior do mundo e na maioria das vezes baldas-te. Baldas-te porque estás farto da escola, de ter sempre a mesma rotina, os mesmos professores, os mesmos colegas de turma, etc. Sabias lá tu que, afinal, esses não eram os maiores dramas da vida.
Neste entretanto, estás mesmo quase a fazer dezoito anos. 18. Aquele número bem redondo com que sonhas-te toda a tua vida. "Já podes fazer tudo o que queres", pensávamos nós. É o ideal que a sociedade nos impôs. Toda a vida nos avisaram que não era bom crescer, que daqui a uns anos nos iríamos arrepender de ter querido tanto a independência. Mas como é lógico, não demos ouvidos. Mas estás a gozar? É lógico que quero tudo a que tenho direito! Deviam ter sido mais diretos e ter-nos avisado com as palavras certas:
Agora que já tens a liberdade com que sonhaste a vida toda, enfim, que és maior de idade, sabes que tens de começar a deixar de contar com a ajuda dos pais. Tens de começar a ser tu a gerar o teu próprio dinheiro, ou seja, tens de ter um emprego. Eu compreendo que não podemos contar com eles a vida toda e muita ajuda eles nos deram. Não os critico. Mas porque raio é que sou obrigada a ter de ter um trabalho para viver? Para viver para o trabalho? Que sentido faz teres a liberdade de um maior de idade se nem sequer a podes aproveitar?
No fim disto tudo, vês-te na merda. Por muito que sejas feliz com o teu trabalho, que adores o ordenado chorudo (ou devia, porque te pagam mal em Portugal) que recebes, que até acordes com um sorriso porque fazes o que gostas, que até tenhas um bom horário e consigas grandes férias... vais acabar por viver uma rotina, dia após dia. Tornas-te rotina.
Com o tempo deixas-te de tudo, porque por todos os motivos, tens de trabalhar. Começas a conformar-te que "ya, é mesmo assim a vida".
Quando dás por ti, és velho. Com sorte, se tiveres cuidado bem de ti (entre outros motivos) estás velho mas com saúde, em vez de caquético. Já estás a gozar de uma boa reforma (só que não) e o que tens, dás. Dás a filhos, netos e a quem precisa. De qualquer das formas, também já não tens muito por onde gastar dinheiro. Dinheiro que te custou uma vida inteira para ganhares e dizes isso com todo o orgulho. Eu respondo-te verdadeiramente na minha, és o maior da tua aldeia.
Foste o maior burro a vida toda. Deixaste que a sociedade te controlasse. Permitis-te que o governo te roubasse dinheiro, por motivos que só a eles fazem sentido. Deixaste que te avaliassem, sim, porque toda a tua vida isso aconteceu. Até mesmo enquanto estudavas foste estúpido porque não aproveitaste.
A culpa disto tudo, definitivamente que não é só tua, pois quando nasceste já estava tudo decidido. Mas tens culpa no cartório. Sabes porque? Aos dezoito anos, de certeza que te apercebeste disto tudo, tal como eu. A diferença é que tu aceitaste essa ideia, acostumaste-te e puseste o trabalho à frente da tua vida. Eu tento ser diferente, venho para aqui lamentar-me da vida da merda que todos temos. Pode ser que algum dia alguém me oiça.